Filiada à:
CTB FSM Contricom UITBB FLEMACON DIEESE
71
3321.3909

    Marina Silva, um “novo” conservador e tradicional

    marina_silva50783

    Na entrevista ao Roda Viva, na TV Cultura/SP, nesta segunda-feira (21), Marina repete velhos chavões, que apresenta como o “novo”. E se diz preocupada com a presença de estatais chinesas, junto com a Petrobrás, no campo de Libra. Para ela, o melhor seria a presença de petroleiras privadas!

    Por José Carlos Ruy
    A ex-ministra e ex-senadora Marina Silva (PSB/Rede) tem feito um esforço notável para se apresentar como o “novo” na política brasileira. E os palcos onde ela manifesta essa disposição têm se multiplicado desde 5 de outubro, quando ela anunciou sua filiação ao Partido Socialista Brasileiro. O mais recente deles foi o tradicional Roda Viva, programa de entrevistas da TV Cultura, de São Paulo, onde ela foi entrevistada nesta segunda-feira (21).

    O palco era apropriado. Sob a batuta do blogueiro de Veja, Augusto Nunes, foi reunida uma equipe de jornalistas entrevistadores que pode ser vista como amplamente favorável à entrevistada Marina Silva – com exceção da editora de Política do jornal Valor Econômico, Maria Cristina Fernandes, a única que, naquela equipe de entrevistadores, fez corretamente seu papel e formulou questões que trouxeram dificuldades para as respostas da ex-ministra (que acrescentou mais um ex à lista que já exibe, garantindo que não é candidata à presidência da República).

    Que novidade Marina Silva representa?

    Onde está a novidade representada por Marina Silva? Não ficou claro, como não tem ficado desde que ela botou o pé na estrada em sua luta contra os governos Lula e Dilma, apresentando-se como uma continuadora dos legados de Fernando Henrique Cardoso e dos governos democráticos e populares. Ela tenta conciliar o inconciliável: as heranças antagônicas desses governos. A dos tucanos, diz, trouxe a estabilidade econômica; Lula e Dilma trouxeram a inclusão social. Esstes legados se completam, pensa ela, e precisam ser preservados e completados com a outra dimensão que ela agrega, a chamada “sustentabilidade”.

    Em apoio ao seu projeto extravagante, ela repete a tese de que a sociedade brasileira “tem um fastio” com a polarização PSDB e PT. E ela própria entra como um terceiro elemento neste cenário polarizado. Terceiro elemento que foge da política como ela é feita – e esta seria a novidade representada por ela.

    Pregou o esvaziamento dos partidos políticos. Está “surgindo um novo sujeito político”, sem as características “das décadas de 1980 e 1990”, que levado à estagnação que envolve PT e PSDB e é personagem de um novo ativismo desligado dos partidos ou sindicatos. Ele foi às ruas em junho, e os partidos não conseguiram fazer uma ponte com este novo ativismo.

    O “terceiro elemento” que ela quer representar é marcado, na política, pela recusa dos partidos e, na economia, por um conservadorismo que diz ser possível juntar crescimento econômico e distribuição de renda em um programa neoliberal que, por definição, é excludente!

    “Meu sonho não é a presidência da República”

    Sobre sua candidatura à sucessão de Dilma Rousseff ela foi, surpreendentemente, comedida. Garantiu que seu objetivo é debater ideias e projetos, e não encabeçar uma chapa em 2014. Foi clara: “o sonho da minha vida não é ser presidente da república”. Disse também que sua filiação ao PSB foi uma espécie de chancela a uma aliança programática, e que sua conversa com o governador Eduardo Campos, de Pernambuco, partiu “do princípio de que o PSB tem uma candidatura”. Agora, disse, é hora de viabilizar o programa e “esquecer a lógica puramente eleitoral”.

    Talvez a saia mais justa enfrentada no Roda Viva tenha vindo com a pergunta de Maria Cristina Fernandes sobre a relação entre Previdência Social e a política de valorização do salário mínimo. A senhora pretende alterar esta política, perguntou a jornalista. Marina escorregou, incomodada, na resposta. Alegou que a Rede ainda não discutiu a questão, disse ser preciso encarar as reformas… Que a discussão ainda não foi feita dentro da Rede… “não tenho ainda a minha reforma da Previdência”. E concluiu, depois de vacilar bastante: a Previdência não pode continuar com o mesmo peso que tem hoje sob pena de mais à frente pagar um preço muito alto. E troxe de volta a trilha sonora preferida dos conservadores e neoliberais…

    Campo de Libra: preocupação com os chineses

    Marina admite que o petróleo ainda é a grande fonte de energia no mundo (os combustíveis sólidos: petróleo, carvão e gás). Infelizmente ainda é um mal necessário, disse.

    Mas ela tem dúvida em relação ao pré-sal, e o centro da dúvida – pasmem! – não é principalmente a questão ambiental, mas a natureza do leilão. Só um consórcio? – perguntou, fazendo eco aos comentaristas conservadores que viram um sinal de fracasso do leilão no afastamento das petroleiras norte-americanas.

    Marina acenou com a ameaça ambiental lembrando o grave acidente ocorrido em 2010, com o vazamento em uma plataforma da British Petroleum (BP) no Golfo do México. Mas a grande preocupação dela ainda não era esta, e sim a participação de estatais no leilão de Libra.

    Atrair investidores estrangeiros, sim, disse Marina. Mas privados. “Vi com preocupação a participação chinesa”, disse. Ante o questionamento sobre o tipo de problema representado pela presença de estatais chinesas, Marina Silva fez uma defesa enfática da entrega do petróleo às empresas privadas estrangeiras. “A gente pode e é desejável atrair o capital privado”, dizendo inclusive que isso poderia ser uma vantagem na arrecadação de recursos para a educação! Mas estatal, não! “Você está interagindo com uma empresa estatal, a não com uma empresa”. Na qual, pensa, é o estado chinês que atua “fazendo exploração com a Petrobrás”. Você vai ter ali a relação governo a governo, numa lógica que “precisa ser melhor entendida”. E, de novo, acentua as “qualidades” da empresa privada.

    Não sou criacionista, mas Deus criou Darwin…

    Houve também o lado folclórico, nunca dispensado numa conversa com Marina Silva. Tratam-se de questões sobre homossexualismo, casamento gay, pesquisas com célula tronco embrionárias (declarou aceitar estas pesquisas com células tronco adultas), criacionismo… Duas posições da entrevistada se destacam. Ela reconhece que as pessoas devem ter tratamento igual mas “quando se fala em casamento, evoco o sacramento”. E, nesta condição não aceita o casamento gay, embora o admita como direito civil. Mas a pérola veio quando falou sobre criacionismo. Não sou criacionista, disse. E declarou acreditar que Deus criou todas as coisas, inclusive a grande contribuição que foi dada por Darwin!

    Crescimento econômico: sem fórmula, com atitude

    Sobre a promoção do crescimento, diz não existir fórmula, “mas atitude”. E aqui retorna à cantilena conservadora: recuperar a capacidade de investimento, ganhar a confiança e a credibilidade dos investidores (perdidas, acredita, em função da inflação e da fragilização do tripé); investir na infraestrutura física e humana. Mas, disse, numa crítica direta à ação do governo, não adianta ficar criando incentivos artificiais!

    Marina Silva é uma mestra em palavras genéricas, em usar expressões vistosas para esconder o que pensa. Suas palavras só se aproximam da realidade quando se referem aos interesses do grande capital, dos grandes investidores. Diz, por exemplo, ser preciso adquirir a confiança deles para que haja investimento e crescimento com qualidade, que permitam a geração dos meios para distribuir renda e promover a inclusão social. É diminuir o gasto do mesmo discurso que prevaleceu com Fernando Henrique Cardoso e o PSDB, e que está fazendo água na crise econômica, que empobrece o povo e os trabalhadores, e que afeta hoje os EUA e a União Europeia. Mesmo assim ela repete estes velhos e carcomidos slogans conservadores a respeito da dívida pública: é preciso, diz, dar eficiência ao gasto publico. Isto é, diminuir os gastos do governo em investimentos e nas áreas sociais, e pagar montanhas de juros aos especuladores. Neste ponto, ela deixou escapar um tom crítico em relação ao Bolsa Família.

    Marina Silva não é evasiva quando aborda temas que agradam aos ouvidos conservadores e neoliberais (como os de seu conselheiro econômico, o economista Eduardo Gianetti da Fonseca). E defende teses caras a eles quando, por exemplo, se esbalda ao falar dos “erros” que vem sendo cometidos pelo governo, inclusive – diz – prejudicando os meios que permitiram a estabilidade econômica.

    Basta ler nos jornalões os comentaristas ligados à especulação financeira para se perceber a natureza desses alegados “erros” – a virada desenvolvimentista representada por Lula e Dilma e os sinais de ultrapassagem do tripé neoliberal formado por superávit primário / metas de inflação / câmbio flutuante. Esse dogma da política econômica conservadora e neoliberal também faz parte do evangelho pelo qual ora Marina Silva.

    Um “novo” conservador e tradicional

    Marina Silva é a recente versão do que há de mais tradicional e conservador na política da classe dominante brasileira.

    A história tem exemplos desse tipo de “novo”; Jânio Quadros, há mais de cinquenta anos, surgiu como uma espécie de alternativa aos partidos e aos políticos; ele bateu de frente com o Congresso Nacional e renunciou melancolicamente sete meses depois de assumir a presidência da República.

    Era em tudo parecido com Marina. Na política, rejeitava os partidos e acusava o Congresso Nacional de chantageá-lo (Marina repetiu esse argumento no programa Jô Soares, dia 15, dizendo que Dilma é chantageada pelo Congresso!). Na economia, defendia o mesmo velho e fracassado programa conservador: contenção nos gastos públicos, pagamento de juros, enxugamento da máquina do Estado.

    No ocaso da ditadura militar, outra versão “jovem”, “apolítica” e economicamente conservadora surgiu na figura de Fernando Collor. Durou pouco…

    São tábuas de salvação usadas por velhos e anquilosados interesses de classe, colonialistas, subordinados ao imperialismo, ligados ao setor financeiro, anti-industrialistas, que sempre criaram obstáculos ao desenvolvimento econômico e ao avanço da democracia no Brasil.

    São os mesmos interesses que, agora, se amontoam atrás da figura de Marina Silva, que cumpre o papel de um novo Jânio. Agora, de saia.

    Fonte: Vermelho